quinta-feira, 28 de outubro de 2010

As "mágicas" do marketing político

Infelizmente, há quem ainda ache (e são muitas pessoas) que o consultor - ou "marketeiro" - político é um cara que fica inventando fórmulas e truques para vender um candidato para a população indefesa, que acaba votando no sujeito como se estivesse comprando um sabonete (sim, a metáfora é sempre o sabonete).

É preciso que se diga que tal imagem se consolidou, também, pela ação de maus consultores e políticos, que acabaram, mesmo, fazendo com que a população se iludisse por candidaturas péssimas.

Mas o fato é que consultoria política é uma atividade muito menos "mágica" do que o senso comum acredita. Não se trata de nada além de pesquisar o cenário eleitoral, aferir os interesses das pessoas e preparar um projeto que atenda às necessidades expostas. Por exemplo: se uma pesquisa diz que a principal reivindicação em uma cidade é a saúde, que adianta um candidato fazer toda a sua campanha falando de educação, transporte ou segurança?

Em termos eleitorais, a adequação se faz também quando se identifica os principais pontos fortes e fracos do candidato diante do eleitor, e realiza-se um trabalho com base neles. Nada de "transformação", nada de "enganação".

No vídeo abaixo, que encontrei abaixo no Youtube, há um exemplo perfeito do marketing político sendo muitíssimo bem aplicado. Trata-se da campanha eleitoral da cidade de São Paulo em 1992, quando os principais candidatos eram Eduardo Suplicy (PT) e Paulo Maluf (pelo partido equivalente ao atual PP). Luiza Erundina (PT) era a prefeita da cidade na época, e ainda não havia a figura da reeleição.

Já existia uma certa tradição eleitoral em São Paulo - que chegou ao seu ápice na eleição para governador de 1990, dois anos antes do pleito sobre o qual falamos agora - que dizia que Maluf sempre disparava nas pesquisas, mas que na hora H perdia a eleição. O motivo era simples: assim como Maluf era ferrenhamente amado por grande parte do eleitorado, era odiado, com muita intensidade, por outra fatia tão significativa quanto a anterior. E embora vencesse os primeiros turnos, na segunda metade se via atropelado pela somatória de praticamente todos os votos dos outros concorrentes.

A campanha de 1992 trabalha com precisão sobre o cenário. Note-se, pelo vídeo, que o foco está no público jovem - ou seja, num eleitorado tradicionalmente anti-Maluf. Isso se deve não apenas a uma tentativa de "conversão" do novo público, mas também pelo fato de acreditar que não havia muito o que fazer com o público mais velho, de posição mais consolidada (e, em grande parte, simpática a Maluf).

É muito boa também a referência aos candidatos derrotados Alyosio Nunes (à época no PMDB, hoje senador eleito pelo PSDB) e Fábio Feldmann (hoje no PV, à época do PSDB). Como já dito, reverter uma tendência natural de rejeição dos votantes em outros nomes era imprescindível para que Maluf chegasse à vitória.

Por fim, o refrão "a gente não tem nada contra o Suplicy / a gente não quer mais é o PT mandando aqui" é genial. Aceita que Suplicy é um candidato carismático, e que portanto ofensas diretas a ele poderiam causar uma repulsa do eleitorado; e trabalha sobre a rejeição habitual que parte do eleitorado tem ao PT, algo que vigora até os dias atuais.

Em que pese a épica presença do grupo Polegar e o exagero nas pinturas das caras dos cantores, trata-se de uma ótima peça.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Como fica o Senado?

Como a essa altura todos já sabem (acho), morreu hoje Romeu Tuma (PTB-SP), senador por São Paulo. Tuma já vivia um quadro complexo de saúde há tempos, a ponto de se ausentar praticamente de toda a reta final da campanha eleitoral recém-finalizada, na qual tentava a reeleição.

(Inclusive, a manutenção da candidatura de Tuma, contrariamente ao que fez o PMDB em relação ao também vitimado por doenças Orestes Quércia, foi alvo de pesadas críticas. Ricardo Young, candidato do PV ao Senado, chegou a acusar o PTB de estelionato).

Tuma perderia o mandato no final do ano. Então, em termos de "composição política", sua morte não altera o cenário do Senado Federal. Mas pode gerar uma situação curiosa.

Afinal, havia mais dois meses de mandato a serem preenchidos. Então é necessário que um suplente exerça o seu cargo nesse período. O primeiro suplente de Tuma é Alfredo Cotait Neto, que é secretário de Relações Internacionais de São Paulo.

Liguei há pouco na Secretaria para saber se Cotait assumirá o cargo nesses meses restantes. O assessor de imprensa informou que ainda não há definição a respeito - o que é natural, devido ao fato ter ocorrido há poucas horas.

Talvez Cotait opte por não optar a cadeira, por conta de sua função na prefeitura paulistana. Iria para o Senado então Alexandre Honore Marie Thioillier Filho, advogado que pleiteia o posto de ministro do Superior Tribunal de Justiça.

Sinceramente, não sei o que a legislação prevê caso Cotait e Thiollier optem por não assumir o Senado (o que seria compreensível, por se tratar de pouco mais de um mês). Se por algum acaso a legislação prever que o contemplado seja o candidato imediatamente abaixo de Tuma na eleição de 2002, teríamos a vaga destinada para... Orestes Quércia.

Há uma situação das mais curiosas se desenhando, essa é a verdade.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Balanço das eleições 3 - A "surpresa" do Senado em São Paulo

Apurados os votos, contabilizados os números, uma das principais surpresas das eleições 2010 se deu na disputa pelas duas vagas do Senado em São Paulo. Até um ou dois dias antes do pleito, Netinho (PCdoB) e Marta (PT) eram dados como eleitos; mas aí a vitória ficou com Aloysio Nunes (PSDB), e Marta obteve ao menos a segunda vaga. Netinho foi o grande derrotado.

Foi a senha para que se iniciasse uma temporada de caça aos institutos de pesquisa, que, em tese, falharam abruptamente ao não identificar o sucesso da candidatura do tucano.

Mas será que as pesquisas falharam mesmo? Ou o que ocorreram foram sucessivos erros de interpretação?

Quando se noticiava a liderança de Netinho e Marta, se baseava em pesquisas que divulgavam as porcentagens dos votos válidos. Ou seja, que desprezavam os votos em branco, os nulos e - o mais importante! - os indecisos.

Segundo o Datafolha, havia, no dia 2 (um dia antes das eleições), 24% de indecisão em relação ao segundo voto, e 11% em relação aos dois para o Senado. Já o Ibope, também no dia 2, constatou também 11% de indecisos e 17% que tinham apenas um nome.

Ou seja: 24%, 17%, 11%... é muita, mas muita coisa. É uma batelada de gente com possibilidade mais que ampla de reverter um quadro eleitoral.

Agora paremos para pensar para onde migariam esses indecisos.

O primeiro lugar no primeiro turno para Geraldo Alckmin (PSDB) para o governo do estado era uma certeza - a única dúvida que permanecia era se o seu percentual seria suficiente para vencer a eleição já de cara ou se haveria necessidade de segundo turno. Também era sabido, com base em eleições anteriores, que era mais provável que José Serra (PSDB) tivesse mais votos que Dilma Roussef (PT) em São Paulo.

Surgia então um paradoxo. São Paulo teria um imenso número de eleitores que votariam da seguinte forma: Serra para presidente, Alckmin para governador, Marta e Netinho para senadores. Faz sentido? Você conhece alguém que votou assim?

Marta e Netinho dispararam na frente das pesquisas pelo recall que ambos têm, uma como ex-prefeita e sempre presente em eleições e o outro como "celebridade". Aloysio, apesar de vasta vida pública, é uma pessoa de certo modo desconhecida do eleitorado.

E a eleição para o Senado - embora menos que as para a Câmara e para a Assembleia Legislativa - atrai menos holofotes que as para o Governo e a Presidência. Não se discute tanto os possíveis senadores quando se discute os possíveis presidente e governador.

Aí, à medida que a eleição foi se aproximando, o eleitor de Serra e Alckmin foi obrigado a pensar: "ei, eu preciso votar em alguém para o Senado!". E foi nessa toada que a candidatura de Aloísio subiu. Foi se solidificando nas pesquisas e, certamente, houve muitas pessoas que no próprio dia da eleição questionaram: "quem é o senador que é contra o PT?".

É essa situação, aliás, que explica a bela votação de Ricardo Young (PV), o quarto colocado na disputa. Young se beneficiou com o segundo voto dos eleitores de Aloysio e até mesmo de alguns que votaram em Marta - a rejeição ao nome de Netinho de Paula sempre foi das maiores.

No fim das contas, antes de demonizar os institutos ou creditar ao "acaso" o sucesso de Aloysio, fazer uma leitura adequada do cenário político e dos números das pesquisas acaba resolvendo a situação. Indecisos: nunca os despreze.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Latinos nos EUA: intenções mais amplas

Dou um tempo nas eleições nacionais para falar um pouco de um tema sempre interessante, a política dos EUA. A edição digital e em espanhol da sempre boa Campaigns & Elections (confira aqui) traz uma interessante matéria sobre o voto latino nas terras de Barack Obama.

Todo mundo sabe que os latinos (ou hispânicos, escolha o tema que lhe convir) são uma população que cresce e muito nos EUA, que o espanhol é cada vez mais falado, que Obama e McCain, tal qual outros tantos políticos, têm feito campanhas políticas específicas para esse grupo, e assim por diante.

A questão que a matéria da Campaings aborda é que ainda há muitas ações feitas para os hispânicos baseadas, unicamente, em preconceitos. O texto fala: há quem acredite que fazer campanhas em espanhol e falar sobre leis de imigração seja o necessário (e suficiente) para agradar a esses grupos.

E pesquisas revelam que os hispânicos, tal qual os outros americanos, querem também saber sobre desenvolvimento econômico, combate à violência, desemprego, etc., etc., etc..

Ou seja: fazer algo extremamente focado acaba soando ineficaz e até um tanto quanto desrespeitoso. Algo como "será que só porque eu sou latino eu não tenho direito de saber suas propostas para a saúde, educação, economia?".

No fim das contas, é mais uma comprovação do óbvio: sem uma boa pesquisa, tudo o que se fizer sai errado.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Balanço das eleições 2 - Tiriricas e afins

"Tiririca é o deputado mais votado do Brasil! Isso é a desmoralização completa da política nacional! E ainda tem a Mulher-Pêra, o Kiko do KLB, a Cameron Brasil! Onde vamos parar!?"

Calma, calma. Vamos com calma nessa análise. É preciso compreender o que realmente significa o fenômeno Tiririca - e, mais que isso, dar a ele a dimensão correta.

Sim, Tiririca está eleito justamente por ter feito uma candidatura à base do escracho, que jogou justamente com a insatisfação que o brasileiro tem com a situação da política como um todo. Isso não é novidade para ninguém.

Mas Tiririca é o único palhaço das eleições? É a primeira pessoa a se candidatar com esse tipo de "plataforma"? Que nada! A cada eleições há dezenas de tipos como ele. Uns ainda mais escrachados, a maioria menos famosa, mas todos apostando na mesma estratégia: a palhaçada como 'marketing político'. E quantos são eleitos? Nenhum, ou praticamente nenhum.

"Ah, teve o Clodovil e o Enéas...". Não, não é por aí. Embora Clodovil e Enéas fossem, também, candidatos escrachados - na minha visão e na da maioria das pessoas - eles levavam-se a sério. E quem votou neles (ou grande parte dessas pessoas) o fez achando que ali estaria um parlamentar de verdade - ou no mínimo alguém que "não tinha medo de dizer a verdade".

Tiririca ganhou a eleição porque contou com um ótimo aparato partidário. Foi o principal candidato de um partido médio. Teve recursos, tempo na TV, e a principal legenda (o 2222) do partido. Não fosse isso, ele certamente não seria eleito - seria apenas mais um integrante do folclore eleitoral, como tantos outros.

Todos - reitero, todos - os outros eleitos para deputado federal em São Paulo não são nem famosos nem "engraçadinhos". Há os políticos de carreira, como João Paulo Cunha (PT), José Aníbal (PSDB) e Aldo Rebelo (PCdoB). Há outros que se beneficiaram por circunstâncias extra-políticas, como o delegado Protógenes (PCdoB) e Iolanda Ota (PSB), a mãe do menino Yves Ota, barbaramente assassinado anos atrás. Todos os outros famosos que tentaram a Câmara e causaram frisson por aí naufragaram nas suas tentativas.

Portanto, um pouco mais de calma ao decretar a falência do sistema político brasileiro e/ou a ignorância total do povo ao analisar os números de Tiririca. Fosse tão feia assim a situação, mais gente "errada" triunfaria.

As aspas no "errada" acima são para ressaltar outro ponto que também merece reflexão. A grande quantidade de candidatos 'famosos' despertou indignações exacerbadas nessa eleição, como nunca vistas. Mas vale pensar: é proibido que alguém que seja famoso queira entrar na política?

Discordo e muito desse dogma. Rejeito - como é óbvio - alguém que não tenha plataforma nenhuma e queira somente se beneficiar da fama. Mas acho possível que um famoso tenha a disposição de contribuir para a coisa pública. E, se isso for bem feito, pode gerar um bom trabalho.

Balanço das eleições 1 - O povo que não concorda...

Há muito, mas muito mesmo o que falar dessas eleições realizadas ontem - e que seguem ainda em curso. Apareceram algumas novidades, outras tantas revelações, e alguns conceitos se confirmaram. Farei alguns comentários ao longo desses dias.

Um, que "abre a série", é uma lembrança de O povo que não concorda comigo é burro, post que fiz em dezembro do ano passado. Trago novamente o assunto à tona porque, infelizmente, tenho visto essas análises se repetindo.

É só ver como alguns blogs estão repercutindo os resultados do pleito de ontem. Dependendo da orientação política dos seus autores, basta cravar que o povo "escolheu certo" ou "não sabe votar" - isso varia de acordo com a existência ou não de concordância entre a opinião do blog e dos resultados das urnas.

Reitero que cravar "inteligência" ou "burrice" do povo de acordo com o que acontece é algo ao mesmo tempo leviano e inadequado. A "cultura" de um povo não se modifica de dois em dois anos, que é o intervalo entre as eleições no Brasil. É mais correto dizer que cada eleição tem sua peculiaridade, e as dinâmicas das campanhas e dos pleitos são o que determinam como a coisa se conclui.