terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Um "nome de rua" pode ser mais do que parece

Criticar os políticos é algo que, já há tempos, se tornou um verdadeiro hobby do brasileiro. Estufar o peito e dizer "político é tudo ladrão" garante certa notoriedade nas festinhas de família, posicionamento em rodinhas com desconhecidos, interação com taxistas ou barbeiros.

Além da desonestidade, critica-se também muito a ineficiência. Que se traduz em alguns componentes tangíveis, como a reduzida semana de trabalho em Brasília ou a incapacidade dos poderes legislativos de realmente atenderem às necessidades da população.

Quem aí nunca leu nenhuma reportagem falando que "das X propostas apresentadas pelos vereadores, Y% [um número invariavelmente alto] foi para solicitar mudança de nome de rua"? Pois é: se o "dólar na cueca" se tornou a materialização da desonestidade, o "pedido para mudar nome de rua" virou a tradução da ineficiência, do desperdício, do "olha o que esses caras estão fazendo, que absurdo".

Pois bem: nesta semana uma "mudança de nome de rua" foi aprovada na Câmara dos Vereadores de São Roque, cidade do interior paulista na região de Sorocaba. Atendendo a solicitação do vereador Marquinho Chula (PSDB), uma via ainda anônima no bairro do Taboão, em São Roque, passará a se chamar Joaquim Justo da Silva.

E é aí que entram os esclarecimentos, para que este texto faça algum sentido. Joaquim Justo da Silva foi meu avô. Faleceu em 1990, quando eu tinha 10 anos. Convivemos pouco, muito pouco. O que sei sobre ele vem das histórias contadas pela minha mãe, tios e primos: foi um comerciante, dono de armazém, soldado constitucionalista em 1932, incentivador da história de São Roque e da educação em geral (ou alguém discorda que enviar uma filha à universidade nos anos 60 é algo a ser destacado?), além de ser filho de um educador e abolicionista.

Joaquim - ou Quinzinho, como sempre fora chamado - vira agora nome de rua. Uma bobagenzinha para São Roque, um "desperdício de dinheiro" para alguns, mas uma alegria a uma família que lutou para a implementação da medida e que busca, sempre que possível, ver enaltecido o nome de seus patriarcas.

A denominação fez com que os familiares - principalmente meu primo Alexandre - se aproximassem do poder público como raramente ocorre. Se sempre enfatizamos que é preciso que seja reduzida a distância entre administração e moradores, taí um exemplo de ação. Além de tudo, São Roque passa a ter mais uma figura histórica com uma homenagem materializada, mais uma pessoa a quem se referirão aqueles que procurarem mais detalhes sobre a história do município.

No cômpito geral, não acho que tenha sido um "desperdício de dinheiro" nem uma "prova da falta do que fazer" dos administradores. E vocês?

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Sobre o "escândalo" dos grandes doadores

Muitos veículos, como Folha e Estado, divulgaram hoje em tom de "denúncia" informações sobre as doações feitas por empresas para a campanha de Dilma Rousseff (PT) à Presidência. As reportagens destacaram o fato da principal doadora individual ser a JBS, empresa do ramo de carnes que recebeu, nos últimos tempos, significativos empréstimos do BNDES.

Desde que - felizmente! - as informações sobre doações de recursos para campanhas eleitorais se tornaram públicas, volta e meia surgem ilações sobre a relação entre doadores e beneficiários. "A empresa X doou um milhão para a campanha do fulano e meses depois foi escolhida em uma licitação" é o tipo de informação que costuma aparecer.

É claro que cabem, e muito, discussões sobre o interesse de grupos empresariais que fazem voluputuosas doações a campanhas políticas. Tendemos a rejeitar, de cara, o discurso de que as companhias fazem o ato "em prol da democracia" ou coisa do tipo.

Mas o que precisamos fazer é analisar mais os dados (que, repito, são públicos; é só ter certa paciência para vasculhar o site do TSE, cuja navegação não é das mais cômodas).

Lá é fácil verificar que é muito, mas muito comum que uma grande empresa que faz uma gorda doação a um candidato costuma... fazer doação semelhante a outro. Ainda que os dois sejam concorrentes, que se digladiem, que estejam em campos ideológicos/políticos diametralmente opostos.

Exemplos? Em 2006, a Acesita doou os mesmos R$ 50 mil a Aécio Neves (PSDB) e Nilmário Miranda (PT), rivais na disputa pelo governo de Minas Gerais. Dois anos depois, foi a vez do Itaú contemplar de maneira igual adversários: não dois, mas três de uma só vez. Gilberto Kassab (DEM), Marta Suplicy (PT) e Geraldo Alckmin (PSDB) receberam doações de R$ 250 mil reais para suas campanhas. Mais uma: R$ 25 mil foram destinados às campanhas de Sérgio Cabral Filho (PMDB) e Denise Frossard (PPS) pela Brascan Imobiliária em 2006. Na ocasião, Cabral e Frossard rivalizavam na disputa pelo governo do Rio de Janeiro.

É praticamente impossível a uma grande corporação ficar imune ao processo eleitoral. Candidatos de todos os portes certamente baterão às portas das companhias solicitando recursos. E, como se vê, o "agradar a todos" acaba sendo o caminho mais seguido.

Enquanto o financiamento público não existir (e será que um dia existirá?) e, principalmente, enquanto os partidos não conseguirem mobilizar os militantes para que contribuam financeiramente com as campanhas, as doações de grandes empresas serão mesmo o maior canal de dinheiro para as campanhas eleitorais. Nada de surpreendente nem de "denunciável" nisso.