terça-feira, 19 de abril de 2011

Dominados e dominantes

Uma discussão bem comum é aquela a respeito dos estrangeirismos na língua portuguesa. Há quem os veja como inimigos do nosso idioma, há os que exageram em seu uso e há o meio termo - no qual eu me encaixo - que defende a adoção de alguns, mas sem forçar a barra e nem substituir palavras ótimas no português por outras similares em inglês só pra ficar mais chique ("orçamento" por budget, "reunião" por meeting e por aí vai).

E um argumento que sempre pinta nessas discussões é o fato da "dominação cultural" que o uso excessivo de estrangeirismos causa. "Desse jeito o português vai acabar!", diz um; "dominar a língua é apenas o primeiro passo para que eles nos dominem por completo!", adiciona outro. (Confesso que já estive também desse lado.)

Curioso é ver que a trajetória do mundo tem nos mostrado exatamente o oposto. Ao invés da "língua de país rico" se impor sobre a "língua de país pobre", o que se vê é o efeito contrário.

Os EUA são o principal campo dessa nova batalha. Estive em Nova York em 2009 e reparei uma semelhança entre as propagandas no metrô de lá e as daqui: em ambos os lugares, um dos tipos de anúncio que mais se vê é o de... escolas de inglês! Lá, tal qual aqui, o apelo da publicidade é falar que estudar inglês "abre portas no mercado de trabalho". Isso em um país majoritariamente falante da língua inglesa, que fez com que este idioma percorresse todo o globo e se tornasse praticamente uma língua universal.

Claro que a situação se deve à imensa quantidade de imigrantes que os EUA recebem há décadas. Ou melhor: os EUA atraem imigrantes desde sua fundação, mas de uns anos para cá o número mais expressivo que chega ao país é o composto por latinos. Esta camada acaba não aprendendo o inglês como fizeram os estrangeiros de antes (não sei o motivo disso, não perguntem), e com isso cresce de maneira impressionante o número de cidadãos norte-americanos (sim, não estamos falando de imigrantes ilegais, e sim de gente que tem o passaporte do país) que não falam o inglês, ou o têm apenas como seu segundo idioma.

As campanhas eleitorais nos EUA, já há alguns anos, trazem peças em espanhol, e a publicidade de tantos outros segmentos também adere ao idioma latino. Há redes de TV e rádio com programação unicamente em espanhol, enfim: é possível ser americano sem falar inglês.

E ontem, ouvindo o ótimo podcast The World In Words, tomei conhecimento da reação que muitos americanos têm empreendido contra esta situação. Os EUA não têm o inglês como sua língua oficial - e estes grupos têm lutado para que isso passe a ser realidade. Emendas individuais nos estados que compõem a federação têm sido aprovadas, e a tendência é que a coisa avance.

O momento atual da política dos EUA, com o avanço do Tea Party e de outros movimentos conservadores, acaba sendo perfeito para que este debate se fortaleça.

O podcast foi finalizado ao som de "Press One For English", canção do grupo country Rivoli Revue que se tornou uma espécie de hino do movimento. O título da música é uma referência a algo que tem causado irritação máxima nos puritanos - o fato de que, ao ligar para algum serviço com atendimento automático de chamadas, a primeira mensagem que se ouve é um pedido para a escolha de qual língua se dará a conversação. "Como assim eu tenho que apertar algo para falar em inglês?!", questionam.

Vejam a letra, com uma tradução por minha conta, e abaixo confiram o vídeo. Façam seus julgamentos.

Press 1 for English

Hey, I can't read that sign out there
Please tell me what's it say
We have to have subtitles
In five languages these days

Now we don't ask too much
To share this land of liberties
But if it's not too much to ask
Could you please speak English

(Chorus)

English is my language
It's the language of this land
And every sign that's posted here
I should understand

I do not live in China, Mexico
No foreign place
And English is the language
Of the United States

Now I'll speak very clear for you
So there'll be no mistake
My family fought and died
Protecting freedoms in these states

Now we all welcome those who come
But when you reach our shores
Folks you should speak our language
Not the one you spoke before

(Repeat chorus)

Now I'm proud of this country
And this great Democracy
And I believe an open door
Should be our policy

But for these opportunities
We'd simply ask you this
Hey you're the one who chose to come
Now choose to speak English

Now here's one thing I question
And try to understand
Hey why must I press one for English
When it's the language of this land

Aperte 1 para inglês

Ei, eu não consigo ler aquele aviso
Me explique o que ele diz
Nós temos que ter legendas
Em cinco idiomas hoje em dia

Nós não exigimos muito
Para dividir esta terra de liberdades
Mas por favor, se não for pedir demais
Você poderia falar inglês?

Refrão

Inglês é minha língua
É a língua deste país
E cada aviso que é colocado aqui
Eu deveria entender

Eu não moro na China, nem no México
Nem nenhum outro país
E inglês é a língua
Dos Estados Unidos

Agora vou te falar bem claramente
Para não haver confusão
Minha família lutou e morreu
Protegendo a liberdade nestes estados

Agora nós recebemos bem todos que chegam
Mas quando vocês alcançarem nossas entradas
Caras, vocês deveriam falar a nossa língua
E não a que vocês falavam antes

(Repete refrão)

Eu tenho orgulho deste país
E sua grande democracia
E acredito que portas abertas
Devem ser nossa política

Mas para essas oportunidades
Apenas pedimos isso
Ei, você que escolheu vir
Agora escolha falar inglês

E agora uma pergunta que eu faço
E tento entender
Porque tenho que apertar 1 para inglês
Se inglês é a língua deste país?

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Há uma revolução pouco notada em curso

Tem passado meio batida uma questão que, se levada à frente, mudará toda a cara do cenário eleitoral brasileiro: a aprovação das candidaturas avulsas.

Resumidamente, as candidaturas avulsas são aquelas que não têm vínculo com partido algum. Nos dias atuais, para que um brasileiro se lance candidato, é preciso que pertença a alguns dos nossos 27 partidos. Caso este sistema avance, no Brasil poderão aparecer candidaturas como as "independentes", muito populares nos EUA.

A ideia foi aprovada pela Comissão da Reforma Política do Senado e ainda terá que ser apreciada pelo plenário do próprio Senado e também pela Câmara dos Deputados. Ou seja: deve demorar muito para que seja posta em prática, e muito provavelmente não vigorará nas eleições do ano que vem.

Seja como for, cabe discutirmos o que acontecerá caso se torne uma realidade.

As principais vítimas das candidaturas avulsas serão, sem dúvida, os partidos pequenos. Daria até para dizer que muitos entrariam em vias de extinção caso o novo sistema vingue. Pelo seguinte: a necessidade do vínculo entre candidato e legenda faz com que a imensa maioria dos partidos nacionais sejam simplesmente balcões de registros de candidatos. Ou alguém acredita que a maioria dos partidos nacionais represente mesmo as correntes ideológicas da sociedade brasileira?

Sem seu poder "carimbador", os partidos menores não iriam muito adiante. E talvez a democracia ganhe, já que os partidos que sobreviveriam teriam que se destacar, que efetivamente representar algo mais do que um simples fornecedor de números.

Há que se pensar também como ficariam as eleições propriamente ditas, em termos mais práticos: qual será o critério para a atribuição de números a estes candidatos? Como será a sua aparição no horário eleitoral? Para as eleições proporcionais, como ficaria a questão do coeficiente? Cada candidato teria que atingi-lo por conta própria?

É difícil também entender como a novidade se dará em termos de marketing eleitoral. Ao estarem desvinculados a partidos, os candidatos terão mais "legitimidade" para se proclamarem uma novidade, surfando assim no consenso de que "político é tudo igual". Já os partidos atuais poderão aproveitar o fato para fortalecer a campanha pelo voto de legenda, apostando na unidade e na legislação da fidelidade partidária - que, embora ainda entre alguns tropeços, ganhou a aprovação da população.

Ainda há muito o que se discutir - e, como dito no início do texto, tenho verificado que a importantíssima questão não tem recebido a atenção que deveria. Tomara que isso se modifique.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Falando em novo partido...

Ontem, ouvindo rádio, levei um susto quando uma propaganda partidária entrou no ar. A propaganda começava com um narrador que questionava: "o que você espera de um novo partido?" Na sequência, pessoas respondiam dizendo que gostariam que este novo partido lutasse por mais emprego, promovesse a sustentabilidade, fosse composto por pessoas honestas, e assim por diante.

Ao ouvir sobre o "novo partido", me surpreendi com o fato do PSD já estar com uma campanha em cadeia nacional. "Caramba, o partido foi fundado esses dias e já está sendo divulgado na rádio, que rapidez, eu achava que ainda faltava o registro no TSE e....". Até que, na conclusão da peça, anuncia-se que a propaganda é do PMDB. O "novo partido", então, é o tradicionalíssimo do número 15, do vice-presidente Michel Temer.

Não sei se a peça do PMDB - direcionada ao público de São Paulo - foi planejada antes da confirmação da criação do PSD. Bem possível, já que o calendário das inserções é definido com bastante antecedência e, em anos não-eleitorais, é costumeiro que o teor das inserções seja mais "frio" e menos relacionado a eventos momentâneos. Caso esta hipótese seja a verdadeira, é nítido que o PMDB adotou a marca de "novo partido" para se desvincular da figura de Orestes Quércia, que presidiu a sigla por décadas até a sua morte, no ano passado.

Apesar de ter sido governador e de deter imensa influência no jogo político estadual, Quércia era uma figura com muita rejeição em São Paulo. A propaganda sugeriria, com base nisso, que o partido está deixando para trás a figura do ex-governador - algo como "pode vir, o Quércia não está mais aqui, agora estamos traçando novos rumos". Curioso.

E, caso a ideia do "novo partido" tenha sido cunhada após a criação do PSD, das duas uma: ou houve muita inocência por parte dos seus criadores, que não pensaram na possibilidade de associação com o partido de Kassab, ou desenvolve-se uma tentativa de marcar o nome do PMDB no embalo da agitação causada pelo PSD. Aguardemos uma explicação oficial.