quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Teste de civilidade

Brasileiro adora viajar pelo mundo e retornar contando, maravilhado, o que viu de bom por lá. Não é por menos: em muitos lugares do planeta há um sem-número de coisas bacanas que não encontramos em terras nacionais (e a recíproca é verdadeira). Entre os itens elogiados, estão as belezas naturais, avanços tecnológicos, gastronomia especial e... noções de civilidade e cortesia. Não se trata de ser puxa-saco de estrangeiros, nem de aderir ao famigerado complexo de vira-lata; o fato é que há alguns costumes que, sim, são mais legais do que os que temos aqui.

O problema é que, em muitos casos, a pessoa que se encanta com a outra realidade não se esforça muito para implementá-la no Brasil. O que costuma ocorrer é um endeusamento do que é feito seguido de críticas intermináveis aos "brasileiros", como se a própria pessoa não fosse ela mesma um brasileiro e pudesse dar a sua contribuição para que as coisas melhorem. Parece ser mais fácil criticar a amorfa e inidentificável categoria chamada "povo" e dizer que "o povo precisa de mais educação". Impreciso, no mínimo.

Pois bem: começa em São Paulo um grande teste para que a população paulistana (e da região metropolitana da capital como um todo, e até de outros locais, já que São Paulo recebe diariamente milhares de pessoas de outros municípios) mostre que quer ser civilizada, que tem noção de coletividade, que se preocupa em aderir ao primeiro mundo de suas utopias. Primeiro com uma campanha "educativa", e agora na base de multas, as autoridades do trânsito de São Paulo vão tentar fazer com que os motoristas da cidade efetivamente respeitem as faixas de pedestre.

Afinal, em São Paulo (e acredito que em tantas outras cidades, aqui e fora) as faixas são apenas meros objetos decorativos no meio das ruas. O pedestre até opta por utilizá-las, mas não existe motorista em sã consciência que pare quando vê alguém pronto para atravessar a rua pisando nas listras brancas.

Como é tudo recente, ainda não temos como aferir se a medida deu ou não resultado (eu torço para que dê). Mas já arrisco uma previsão: um imenso número de motoristas furará as regras, receberá uma multa, ficará indignado com "a indústria das multas" e elogiará a civilidade "que se vê no primeiro mundo". A aguardar.

Abaixo, matéria da Globo a respeito:

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Da pancadaria emerge uma lição

Eu não gosto de MMA. Não chego a ser como meu amigo Eduardo Maretti, que repudia o esporte com todas as forças, mas o fato é que não vejo graça, não me entretenho vendo uma luta do UFC.

Mas independentemente do que eu ache, o fato é que o MMA pegou no Brasil. Deu certo. O esporte é um sucesso. Frequenta capas de jornais e, o mais importante, conversas na rua. Os brasileiros gostam de MMA, os brasileiros assistem ao MMA, os brasileiros têm real interesse no MMA. A prova disso se vê em números. A transmissão do UFC Rio, no final de agosto, deu à RedeTV! a liderança no Ibope.

A ascensão do MMA chama a atenção. Por muitas vezes, nos acostumamos aqui no Brasil a um discurso - e preparem-se, ano que vem é ano de Olimpíada, ele aparecerá fortemente - de que o esporte precisa de "apoio". Por essa análise, é preciso que patrocinadores em geral e, principalmente, o poder público, deem suporte técnico e financeiro a diferentes modalidades esportivas, para que elas possam cair no gosto do público e desenvolverem plenamente seu potencial de formar campeões. Ainda nessa linha de raciocínio, só assim se conseguiria superar a cultura "monoesportiva" do Brasil, onde supostamente só o futebol interessa.

Pois bem, enquanto na maioria dos esportes olímpicos o patrocínio estatal impera - alguém se lembra de algum atleta expressivo que não ostentava as marcas de Petrobras, Caixa, Banco do Brasil ou similares nos uniformes? - o MMA conseguiu caminhar com suas próprias pernas. Seus competidores são financiados por empresas particulares. Anderson Silva, a principal estrela nacional na categoria, tem feito propaganda atrás de propaganda, além de ter se tornado uma figura quase que permanente nos programas esportivos.

É claro que o MMA tem uma gigante estrutura profissional por trás. O negócio gera dinheiro, expressivas quantias, em especial nos EUA, a terra do marketing e dos bons negócios. Ainda assim, não se pode tirar o mérito do esporte. Se uma fábrica de motos ou restaurante fast-food se propõe a ter Anderson Silva como garoto-propaganda dos seus produtos, é porque vê nele um bom chamariz, acredita que ele tem potencial de mercado. "Merece", portanto, ter seu esporte financiado.

A demanda por apoio por parte dos praticantes dos esportes olímpicos é justa - afinal, financiar o esporte é uma obrigação governamental, está na Constituição e tudo o mais. Mas o exemplo do MMA merece ser anotado e ponderado por cada um dos esportistas que irá ao público reclamar por verbas nos próximos meses. Sem apoio governamental, o MMA deu certo. Se consagrou como entretenimento. Será que é "só" de apoio que os outros esportes precisam para caírem no gosto popular?

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Sobre o voto distrital

Tem ganhado força o debate sobre o voto distrital. Há um movimento organizado - que se diz apartidário - de nome #EuVotoDistrital, que mantém um bom site e que almeja o recolhimento de um milhão de assinaturas para que o projeto seja analisado com mais força pelos congressistas.

A discussão sobre o voto distrital é bacana, e por dois aspectos. O primeiro é por ser um debate essencialmente político, no sentido mais preciso do tema. Não se tratam daquelas mobilizações vagas "contra a corrupção" ou "por mais educação e saúde", temas nos quais todo mundo concorda. É uma discussão concreta, em que se apresenta um problema e uma solução prática a ele. A outra virtude é que discutir o voto distrital é algo que vai com precisão a um dos maiores problemas da política nacional, o Poder Legislativo - muitas vezes, a culpa é jogada unicamente nas costas no Executivo, sendo que sabemos que são os congressistas os principais responsáveis por defeitos que aparecem por aí.

Mas apesar dessas virtudes, eu discordo do movimento. Acho que o voto distrital não é uma solução (aliás, serei justo: o site em nenhum momento trata a questão como a panaceia universal; só aponta que algumas falhas serão diminuídas se o sistema for adotado). E aponto isso por dois motivos:

- segundo seus defensores, o voto distrital, por eleger deputados federais ligados a distritos específicos, faria com que os representantes estariam mais próximos da população, que assim poderia cobrá-los com mais eficácia. A premissa é até válida, mas analisemos na prática: nas cidades, com os vereadores, existe tal cobrança? Será mesmo que as populações de municípios de 200, 100 e até mesmo 50 mil habitantes são tão vigilantes assim a ponto de impedirem desmandos? Sabemos que corrupção existe no Brasil em entes de tudo quanto é porte. Acreditar que a população passará a ser ativa de uma hora pra outra apenas por uma questão de "proximidade" é algo utópico demais. E nega o que já acontece na realidade.

- acredito - e isso é uma visão pessoal - que deputados federais não têm que representar "minha cidade", ou "meu bairro". Na Câmara e no Senado se votam assuntos de interesse de toda a nação - acordos internacionais, leis relativas a questões familiares como adoção e casamento homossexual, legislações penais, políticas tributárias... ou seja, a maior parte dos assuntos transcende uma comunidade em especial. Aliás, nestes debates maiores, não se vê - numa suposição - os deputados do Amapá votando de um jeito e os do Rio Grande do Sul de outro, apenas para citar dois extremos geográficos do país. Os parlamentares acabam se posicionando mais de acordo com suas convicções pessoais e outros interesses. A representação atual permite que categorias - evangélicos, homossexuais, esportistas, mlitantes da cultura, etc - elejam seus representantes, o que é muito bom! Esse tipo de vínculo pode ser muito mais forte do que o local, em muitos casos.

Além disso, acho que o movimento se equivoca ao pautar parte de suas críticas ao sistema atual tendo como base algumas distorções - a mais célebre delas a eleição de candidatos que receberam menos votos do que os demais, caso no qual Enéas Carneiro é o maior exemplo. O sistema proporcional, críticas à parte, ainda é válido. Se tivéssemos partidos "pra valer", seria ainda melhor, mas acaba sendo adequado dentro das nossas circunstâncias.

De qualquer modo, vai aí um vídeo do #EuVotoDistrital para que vocês vejam e formulem suas próprias opiniões.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Rejeição, mais importante do que a intenção

A Folha divulgou e inúmeros veículos repercutiram pesquisa do Datafolha sobre a corrida para a eleição municipal do ano que vem em São Paulo. A manchete do levantamento seria o fato da senadora e ex-prefeita Marta Suplicy aparecer em primeiro lugar em todos cenários em que ela é a candidata do PT, numa perfeita oposição ao fraco desempenho de Fernando Haddad, o candidato preferido do ex-presidente Lula.

A meu ver, dados sobre intenção de voto pouco ou nada revelam, quando obtidos em um momento tão distante da eleição. É só lembrarmos das eleições presidenciais: Lula venceria no primeiro turno em 1994 e 1998, e Serra faturava fácil em 2010; ainda em São Paulo, Gilberto Kassab dava traço nas pesquisas ainda em 2008.

O eleitorado ainda não pensa na eleição, os nomes não estão claramente definidos e assim acaba sendo natural que as personalidades com mais recall acabem sendo mais beneficiadas.

Não se enganem: Marta ou Haddad, Serra ou Bruno Covas ou José Aníbal, todos eles terão cerca de 30% dos votos quando se apurarem as urnas em outubro do ano que vem. É inconcebível que PT e PSDB tenham percentual tão inferior a esse. Não faz sentido, agora, tratar Fernando Haddad como um candidato minúsculo.

Ao contrário das análises em geral, que viram um bom desempenho de Marta, a visão que tenho dos números é oposta. Porque as manchetes se apegaram à intenção de voto e deixaram de lado os índices de rejeição. Neles, Marta tem 30% - perde apenas para Netinho (PCdoB, 33%) e Serra (32%). Já Haddad nem citado é - o que é natural, já que quem é desconhecido não pode ser rejeitado.

Pouco menos de um terço do eleitorado paulistano, portanto, não votará em Marta de maneira alguma. É muita coisa. É praticamente impossível uma vitória com tal cenário (o que também inviabilizaria a candidatura de José Serra).

A liderança atual de Marta se deve mais ao recall do que qualquer outra coisa. Foi ele, inclusive, que a colocou na dianteira de todos os levantamentos até a apuração do primeiro turno de 2008. Não chega a ser um grande feito. Ou melhor: pode até ser algo considerável, mas é muito menos significativo do que a rejeição que ela tem.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

A mídia ao lado dos "outros"

Há uma coisa que me intriga muito na relação entre os veículos de comunicação e a população em geral: o consenso de que a mídia está do lado dos "outros", dos seus opositores, seja lá quem você ou seus adversários sejam.

No futebol, paulistas dizem que a mídia é favorável aos times do Rio, os cariocas retrucam dizendo que os de São Paulo são os beneficiados; católicos afirmam que sua religião é atacada dia após dia - evangélicos retrucam dizendo que são eles os perseguidos, enquanto os não-religiosos contestam citando um suposto "conservadorismo" da mídia nacional, sendo eles então as vítimas. Quanto à política, não preciso nem me estender: buscas rápidas no Google para "imprensa petista" e "imprensa tucana" revelam um desesperado interesse de um lado em dizer que o outro tem a "máquina" a seu favor.

O jornalista André Kfouri, da ESPN e do Lance, escreveu certa vez texto monumental a respeito, dizendo que "confessava" fazer parte da organização secreta denominada “Imprensa Unida para Prejudicar o Seu Time”. Vejam o texto no site do Lance.

Falo disso porque tive conhecimento de texto do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) a respeito do assassinado da juíza Patrícia Acioli - ou melhor, da cobertura da imprensa sobre o caso. No texto, Jean diz que a ação da mídia sobre o crime esteve mais focada na vida pessoal da juíza do que na tragédia em si. Ou, nas palavras de Wyllys, "A cobertura jornalística do assassinato da juíza Patrícia Acioli, em Niterói (RJ), deixa claro que as mulheres ainda têm, no espaço público, a vida avaliada a partir de suas vidas privadas. "

Jean não fala isso à toa. Se cita o ocorrido, é porque ele realmente aconteceu. Mas é curioso como as percepções são relativas. Tudo o que li a respeito do assassinado de Patrícia tinha como principal foco a insegurança da qual todos os brasileiros são vítimas - em especial os que combatem o crime. Justamente sob esse prisma, Acioli foi vista como uma espécie de heroína ou mártir, alguém que morre em nome de uma causa. O trabalho de Patrícia na justiça foi (justamente) valorizado e sua morte foi vista como uma espécie de contra-ataque do crime a alguém que o deteriorava - algo do que o brasileiro médio adora ter conhecimento, aliás.

Ligado a questões como o combate à homofobia e ao sexismo, Jean acabou se portando como um torcedor afetado pela “Imprensa Unida para Prejudicar o Seu Time” neste caso. Puxou um aspecto negativo da cobertura e deu a ele uma dimensão maior do que o devido.

É curioso, mas bem curioso mesmo, como tal fenômeno acaba tendo características onipresentes.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Mr. Postman

A Campaings & Elections traz texto interessante sobre outra faceta da crise dos EUA, e suas consequências em cascata.

O que a reportagem diz é que os correios de lá amargam prejuízo atrás de prejuízo - segundo o texto, serão mais de 8 bilhões de dólares só em 2011 - e, com isso, a entidade terá que fazer mudanças para sobreviver. E uma das mais cotadas é modificar o sistema de distribuição das correspondências. Em um primeiro momento, eliminando as entregas aos sábados e, futuramente, realizando o serviço apenas três dias por semana.

Como é voltada às campanhas eleitorais, a Campaings & Elections aborda o quanto essa modificação alteraria o jogo político por lá. Nos EUA, o uso de correspondência para as campanhas é fortíssmo. Inúmeras consultorias são especializadas no serviço. São duas as principais preocupações dos profissionais: a eliminação do envio de materiais às vésperas das eleições, que ocorre justamente aos sábados, e o fato de que, com menos dias de entregas, os eleitores recebam muito conteúdo de uma vez só, tendendo assim a desprezar a propaganda.

Parece anacrônico falar em propaganda eleitoral via correio para nós, porque aqui no Brasil ela é muito frágil e porque nossa tendência é achar que com a internet, os celulares e etc o que chega via carteiro passa a ter relevância quase nula. Fica então curioso ver como um país mais avançado tecnologicamente que o nosso ainda se baseia neste recurso. Questões culturais, sempre elas, jamais devem ser desprezadas.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Sobre eleições em meio de mandato

A Folha de S. Paulo publicou ontem boa matéria falando sobre as movimentações para a eleição para a prefeitura de São Paulo, que ocorre no ano que vem. Indiscutivelmente, o pleito do ano que vem tende a ser o mais incerto e equilibrado, talvez, desde a redemocratização.

O PT pode lançar Fernando Haddad, Marta Suplicy ou Aloizio Mercadante; no PSDB, os pré-candidatos são José Serra, José Aníbal, Bruno Covas e Andrea Matarazzo; o nome do recém-fundado PSD é Guilherme Afif Domingos; o PCdoB tem Netinho de Paula; e o PMDB oscila entre Gabriel Chalita e Paulo Skaf. Todos são candidatos competitivos, em maior ou menor grau.

Mas mais do que falar sobre a disputa eleitoral paulistana, gostaria de chamar atenção para outro ponto. Da lista dos pré-candidatos mencionados acima, todos, com exceção de Paulo Skaf e José Serra, ocupam atualmente algum cargo público. E seis deles - Marta, Aníbal, Covas, Afif, Netinho e Chalita - obtiveram o cargo após vitória em eleições anteriores.

Sobre isto que gostaria de centrar o debate, até porque vejo que esta questão costuma ser pouco aprofundada: como a população lida com o fato dos políticos que elegeu abandonarem os cargos na metade (ou antes, ou depois) para buscarem outro posto?

Aparentemente, exemplos nos sugerem que isso não parece ser um problema dos maiores, ao menos não no contexto eleitoral. A trajetória de José Serra é um bom exemplo: foi eleito senador por São Paulo em 1994 e jamais exerceu o cargo, preferindo ministérios no governo FHC; em 2004, foi eleito prefeito de São Paulo e abriu mão do posto dois anos depois, para buscar o governo estadual; foi eleito e não pleiteou a reeleição em 2010, porque foi candidato à Presidência. Ou seja: a população paulista votou em um candidato que neste sentido foi, digamos, "reincidente". A expressiva votação de Netinho de Paula (vereador paulistano, só para lembrar) na eleição para o Senado no ano passado reforça caráter semelhante - de todos os fatores que fizeram Netinho perder a eleição embora tenha liderado por muito tempo as pesquisas de opinião, certamente o fato de ser rejeitado por já ter um mandato foi um dos menos importantes.

O cenário descrito para as eleições paulistanas em 2012 sugere que não deveremos ter o assunto trazido à tona. Afinal, todos os grupos partidários, de uma forma ou de outra, têm "falha" neste aspecto. Mas seria interessante ver o tema ser discutido de maneira mais viva, e mais utilizado nas campanhas eleitorais. É uma arma ainda de certo modo desprezada.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Entrevista com diretor do Partido Libertário, a terceira força dos EUA

Democrata e Republicano, os dois únicos partidos que existem nos EUA, certo? Errado. Embora os dois dominem - com larga vantagem - a política do país de Barack Obama, há outras agremiações de relativo peso que também militam por lá.

O mais forte dentre os outros é o Partido Libertário. A sigla existe desde 1971 e, nestes 40 anos, consolidou sua posição de "terceira força" - detém uma série de mandatos em todo o país, como pode ser conferido em seu site oficial.

O diretor-executivo do partido, Wes Benedict (foto: divulgação), concedeu uma entrevista exclusiva ao Blog Olavo Soares, na qual expôs a visão e a linha ideológica dos libertários. Segundo Benedict, o partido está "igualmente distante" de Democratas e Republicanos - não podendo, portanto, ser comparado a nenhuma das siglas maiores.

De fato, o programa do Partido Libertário é não apenas distante dos partidos que comandam a política local como, de certo modo, foge até do que nós brasileiros estamos habituados a definir como política. Pense em uma disputa eleitoral brasileira, por exemplo. Por mais que os partidos se digladeiem e façam o maior esforço possível para se mostrarem diferentes, ambos dirão que querem "melhorar saúde e educação", não é mesmo?

Pois bem: os libertários não querem "melhorar saúde e educação". Ao contrário, o que eles querem é acabar com saúde e educação fornecidas pelo governo. E com grande parte dos serviços públicos. A filosofia do partido é que o estado deve aceitar que é incompetente para tocar estes serviços, assim delegando-os para a iniciativa privada. Com isso, na visão deles, os impostos se reduziriam drasticamente e a população pobre seria a maior beneficiada.

Para quem está acostumado com a direita clássica, não há muita novidade no dito acima. Então como os libertários se diferenciariam dos republicanos, os mais tradicionais defensores do liberalismo nos EUA? A resposta vem por meio da posição firme que o partido tem em relação a questões como casamento homossexual e uso de drogas - é inflexivelmente a favor de ambos.

Resumindo, a filosofia do Partido Libertário é a do estado mínimo (pela qual está mais próximo da direita) e das liberdades individuais (o que o aproxima da esquerda). Leia a entrevista exclusiva e forme sua opinião a respeito das convicções do partido. Poderiam ser aplicadas no Brasil?

O Partido Libertário completa 40 anos em 2011. Como o partido se vê, 40 anos após a fundação? É uma trajetória de mais conquistas ou insucessos?
Mesmo que não tenhamos vencido muitas eleições, o Partido Libertário gerou um tremendo impacto na política nacional. Recentemente, o congressista Ron Paul (Texas) e seu filho, o senador Ran Paul (Kentucky) alcançaram grande sucesso. Ron Paul foi candidato à Presidência da República em 1988 pelo Partido Libertário. Ainda que ele e seu filho sejam, hoje, republicanos, o Partido Libertário preparou o caminho para seu sucesso e o de suas ideias.

Os EUA se tornaram mais libertários em alguns aspectos, como se pode ver com a expansão dos direitos dos homossexuais e a legalização da maconha, ocorrida em alguns estados. O Partido Libertário esteve à frente dessas disputas. Mas em questões econômicas, infelizmente, impostos e gastos públicos subiram de maneira significativa.

Quais são as principais dificuldades vividas pelo Partido Libertário? Seria o fato dos americanos pensarem apenas nos Republicanos ou Democratas como opção de voto, ou há outras questões?
Democratas e Republicanos fazem um ótimo trabalho, ao convencerem a população a votar “no pior dos dois males”. Além disso, ambos produzem leis que tornam ainda mais difícil a trajetória de um terceiro partido rumo às urnas.

Quais são os objetivos concretos do Partido Libertário? O partido realmente busca a eleição de parlamentares, governadores e até mesmo um presidente da República, ou a ação política tem outras metas?
O Partido Libertário trabalha para promover liberdade. Ganhando ou perdendo, cada voto em um libertário faz diferença. Quando disputamos eleições maiores, como as para governos estaduais ou Presidência, as campanhas têm como primeiro objetivo transmitir a mensagem libertária para o público e forçar Democratas e Republicanos a falarem sobre questões importantes.

A principal bandeira do Partido Libertário é o “governo mínimo”. O que isso significa na prática? O que segue sob controle do Estado, quando da aplicação desta filosofia? Como seriam os EUA com um presidente libertário?
Cortaríamos taxas e gastos públicos, encerraríamos a guerra contra as drogas, acabaríamos com programas como Medicare e Social Security [equivalentes estadunidenses ao SUS e ao INSS], acabaríamos com as guerras no Iraque e Afeganistão, não subsidiaríamos nenhuma empresa, finalizaríamos a educação provida pelo governo – em suma, deixaríamos de fazer quase tudo o que o governo faz.

Legalizaríamos prostituição, casamento homossexual e protegeríamos uma liberdade religiosa que contemplasse todas as religiões. Manteríamos um pequeno exército para defesa, além do sistema judicial e uma polícia suficiente para assegurar a liberdade individual e os direitos de propriedade. Todas as outras questões – e até mesmo algumas dessas últimas mencionadas – seriam oferecidas de acordo com as necessidades de mercado. Acreditamos que os pobres sairiam ganhando com este sistema, embora eu saiba que os políticos tentem nos convencer que os pobres sofreriam sem o governo para ajudar.

Como é a relação do Partido Libertário com as minorias dos EUA – homossexuais, latinos, negros e outros? O partido está mais próximo ou mais distante delas do que Republicanos e Democratas?
O Partido Libertário defende liberdade para todos. Somos o partido mais próximo da comunidade LGBT, além de fortes apoiadores dos ideais de fronteiras abertas e imigração facilitada. O que não defendemos são privilégios específicos para alguma minoria em especial.

Qual é a visão do Partido Libertário para política externa? Um governo libertário, neste sentido, estaria mais próximo do de Barack Obama ou do de George W. Bush?
O partido é antiguerra e a favor do livre comércio e da imigração facilitada. Somos bem diferentes de Bush e Obama nessas questões. Obama, inclusive, nos desapontou bastante com sua postura pró-guerra, ao atacar a Líbia e estimular a guerra no Afeganistão.

Na sua avaliação, a maneira de conduzir a administração pública defendida pelo Partido Libertário poderia ser aplicada em um país pobre? Ou ela é apenas viável para nações que já alcançaram um status melhor de desenvolvimento?
O libertarianismo é o oposto do autoritarismo. A administração pública defendida pelo Partido Libertário faz países pobres se tornarem ricos, e liberta a população oprimida. É ótima para todos – e perigosa para ditadores.

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O site do Partido Libertário tem um quiz no qual é possível verificar se você se identifica com as propostas da sigla. Vale ver o World's Smallest Political Quiz.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Pão, circo, emprego e renda

À parte de casos mais polêmicos como a denúncia sobre corrupção no Ministério dos Transportes, um pequeno escândalo eriçou a opinião pública nos últimos dias: a divulgação do fato que o Ministério do Turismo investiu R$ 22 milhões em festas juninas neste 2011 (veja matéria do Congresso em Foco).

Foi a senha para que bradassem os costumeiros sinais de indignação contra o "mau uso" do dinheiro público no Brasil. "Com tanta gente passando fome, com escolas sofríveis e hospitais precários, como que o governo investe em festa junina?", questionaram muitos. Outros já empregaram o irritante chavão do "pão e circo" para dizer que a população brasileira só quer saber de festa e não se importa com a realidade do país.

Hum. Talvez seja o caso de refletir um pouco mais sobre o ocorrido antes de despejar críticas. O primeiro a se fazer é investigar de onde veio a verba - do Ministério do Turismo. O Ministério do Turismo tem como obrigação... investir no Turismo, certo? E o que é investir no Turismo? Conservar museus, cuidar de paisagens naturais, capacitar pessoas e promover eventos.

No Nordeste, as festas juninas geram repercussões de certo modo comparadas às dos carnavais. Movimentam muita gente - e, por consequência, recursos. Não tenho números, mas acredito que o carnaval deve representar um fator importantíssimo para cidades como Salvador e Rio de Janeiro. Sem o evento, municípios como estes passariam por problemas no orçamento. Com as festas juninas, acontece a mesma coisa, talvez em escala menor.

Ou seja: é muito mais que "pão e circo". Investir em festa junina - e carnaval, e rodeio, e festa do leite, e etc - é mobilizar a cidade, garantir renda ao setor hoteleiro, aquecer o comércio e por aí vai. Resumindo, gerar emprego e renda. A obrigação de qualquer governo, estamos de acordo?

Em tempo: há críticas sobre a maneira como essas verbas foram distribuídas (para privilegiar aliados do ministro) e denúncias de corrupção ligadas ao caso. Isso é sério, mas pertence a outro escopo da discussão, completamente diferente. Aí falamos de apadrinhamento e desvio de dinheiro público - o que não muda nada no que tange à importância do objetivo inicial.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

PTB vai bem ao colocar dedo na ferida

Como já falei em outras postagens, eu gosto de campanhas partidárias que marquem posição. Ainda que não concorde com o que é dito, aprecio quando um partido dá uma opinião sobre um assunto, e não que fique com aquele discurso vago e patético do "vamos lutar para melhorar a saúde e educação", como se alguém fosse contrário a isso, ou como se o eleitor fosse se despertar por palavras tão vagas...

E é isso que o PTB tem feito com uma campanha que começou a circular nessa semana, nas inserções partidárias no rádio e na TV. O partido foi bem ao ponto, e tenho certeza que a inserção trará resultados positivos. Vejam:



Falando sobre o conteúdo propriamente dito: embora eu seja contra o financiamento público exclusivo de campanha (acredito que o privado, em especial de doadores menores, é um grande fortalecedor da democracia), ele existe e tem muito valor. A publicidade diz que "Estão querendo que você pague as campanhas eleitorais". Cá entre nós, isso já é (parcialmente) feito, por meio do fundo partidário, composto por recursos públicos e que é distribuído a todas as siglas. E ao tratar o assunto assim o PTB simplifica muito a questão, que é mais complexa do que parece.

Mas de qualquer forma, o partido faz barulho. Pega uma causa que tende a ter aceitação nacional e se identifica com ela. Muitos brasileiros verão o vídeo e associarão a ideia ao PTB. Que o partido saiba trabalhar com isso nas eleições do ano que vem.

Em tempo: ao bancar a luta contra o financiamento público, o PTB se coloca diretamente em rota de colisão com o ex-presidente Lula, de cuja base participou. Lula é defensor do financiamento exclusivamente público, como podemos ver a partir de 1:35 neste vídeo.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Jean Wyllys, sobrevivente do paredão

Ainda com menos de seis meses completados, a atual legislatura da Câmara de Deputados tem em Jean Wyllys (PSOL-RJ) um dos seus maiores destaques. Jean encampou a luta dos gays e tem recebido grande destaque nos tempos atuais, marcados pelo debate sobre os direitos dos homossexuais no Brasil.

Ao se consolidar como militante de uma causa, Jean vai aos poucos fazendo com que ele deixe de fazer parte do "baixo clero", aquele grupo de parlamentares cujo destaque na Câmara é irrisório.

Além disso, o deputado merece também méritos por outra razão: vai detonando a ideia de que os "famosos" que chegam ao poder nada têm a acrescentar à política nacional.

Para quem não sabe, este Jean Wyllys é o mesmo cidadão que, em 2005, foi o vencedor da quinta edição do Big Brother Brasil. Embora desde o início Jean destoasse do perfil típico dos participantes do programa - era professor universitário, militante gay, e dizia que sua entrada no Big Brother se devia a uma "pesquisa" - não dá para negar que Jean, é, sim, um "ex-BBB", categoria de brasileiros tão atacada nos últimos tempos. Afinal, por mais que Jean tenha todo esse currículo e militância, possivelmente jamais o conheceríamos se não fosse o programa global.

E ao fincar seu pé e mostrar serviço na Câmara, Jean diz que, sim, é possível que um "famoso" trabalhe. Ressaltar esse 'feito' é de certo modo uma obrigação, quando lembramos que, ano passado, a candidatura de Tiririca e outros famosos causou verdadeira revolta entre os brasileiros. Se dizia, à época, que a presença dessas pessoas nas eleições seria a confirmação de que a política nacional estaria virando uma bagunça.

Mas com exceção da de Tiririca, esculachada por definição, qual é o problema de um "famoso" se candidatar? Por ser ou ter sido cantor, ator, jogador de futebol ou ex-BBB, uma pessoa se torna menos cidadã, menos apta à vida pública? Não, e Jean Wyllys nos mostra isso.

Não defendo todas as posturas do deputado. Aliás, por mais que acredite em atuações setoriais, sou relativamente contrário a parlamentares que permaneçam restritos a determinadas causas - espero, que nos três anos e meio que virão, que Jean atue também para melhorar a saúde, emprego, meio-ambiente, relações internacionais e todos os outros temas que passam pela Câmara. Mas não dá para negar que sua postura merece ser elogiada.

terça-feira, 3 de maio de 2011

PP investe no repetitivo

O Partido Progressista está transmitindo suas inserções no rádio (ao menos em São Paulo). Lembrando que, como 2011 não é ano de eleição, não teremos o horário político clássico, e sim aqueles comerciais rápidos inseridos nos intervalos das rádios e televisões, que se parecem e se misturam com os comerciais dos produtos em geral.

Iria abrir o texto dizendo que se tratava da nova propaganda do PP, mas... se tem uma coisa que o anúncio não é, é novo. Seu formato é o mesmo que o partido tem adotado há uns 10 anos: uma voz em off fala algo como "Quando o Partido Progressista está no governo, o que acontece é isso", e se destila um rosário com as intermináveis ações de Paulo Maluf como governador e prefeito. Por fim, o próprio Maluf volta ao vídeo para falar mais algumas coisas e garantir que a propaganda se encerra com a sua imagem.

Maluf ainda é uma força política em São Paulo - seus mais de 490 mil votos e a terceira posição entre os candidatos a deputado federal mais votados na eleição passada demonstram isso. Porém, é inegável que o deputado já foi mais expressivo do que é nos dias atuais. Novamente recorrendo a números, seu pífio desempenho nas disputas municipais em 2004 e 2008 deixam a questão clara.

Não cabe ao PP, evidentemente, desprezar sua principal liderança e "puxador de votos". Porém, é nítido que o partido precisa se reciclar, apresentar novas lideranças - aliás, a própria candidatura de Celso Russomano a governador nas eleições passadas foi algo nesse sentido. Até mesmo o uso da figura de Maluf poderia ser repensado. Será mesmo que o eleitorado precisa saber o que é "obra de Maluf"?

Foto: pp.org.br

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Embu vota e muda de nome

Aconteceu ontem, na Grande São Paulo, uma eleição interessante: a população da cidade de Embu foi às urnas para decidir se o nome da cidade permaneceria como é ou se seria modificado para "Embu das Artes". Veja matéria da Rede Globo a respeito:



Para quem não conhece, Embu é uma cidade na região sudoeste da Grande São Paulo caracterizada por uma grande feira de artesanato realizada aos domingos, que a deu o sufixo "das Artes". De apelido, agora a derivação passa a ser nome oficial da cidade, constando em registros de nascimento e chapas de veículos, entre outras ocorrências oficiais.

A mudança de nome teve como principais justificativas a diferenciação da vizinha Embu-Guaçu e a ampliação de um chamariz para os turistas - a feira que deu fama à cidade atrai um considerável número de pessoas e movimenta de maneira definitiva a economia do município.

Sobre a eleição em si, é possível até dizer que a quantidade de votos válidos a favor do "não" surpreendeu. Foi de 33,52%, quando se esperava menos (é até possível reparar, na matéria da Globo, que o entrevistado pró-não fala para dois microfones, o que deve ser explicado pela dificuldade de achar alguém que estivesse do seu lado). Durante os meses que antecederam a votação, a campanha da administração municipal a favor do "sim" tinha como slogan o ótimo "Todo mundo quer". Ou seja: não havia oposição organizada.

Curioso é ver o grande número de abstenções. Foram 31,48% de ausentes, segundo a prefeitura - o número impressiona ainda mais se contrastado com a abstenção nas eleições municipais de 2008, que foi de pouco mais de 13%.

Mas a explicação é simples. Ao contrário do ocorrido ontem, nas eleições em geral há a presença maciça do assunto nos meios de comunicação. Por outro lado, por mais que tenha havido uma boa divulgação do pleito por parte das autoridades eleitorais e do Embu (das Artes?), é difícil falar sobre eleições sem que haja um contexto maior conspirando para tal. Ainda mais em cidades da região metropolitana, o que é o caso de Embu, cuja programação televisiva é dominada pelo noticiário da capital, tradicionalmente menos interessado no que acontece nos municípios próximos.

De qualquer modo, boa sorte ao povo de Embu - das Artes! Que a votação marque o início de uma nova fase na cidade.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Dominados e dominantes

Uma discussão bem comum é aquela a respeito dos estrangeirismos na língua portuguesa. Há quem os veja como inimigos do nosso idioma, há os que exageram em seu uso e há o meio termo - no qual eu me encaixo - que defende a adoção de alguns, mas sem forçar a barra e nem substituir palavras ótimas no português por outras similares em inglês só pra ficar mais chique ("orçamento" por budget, "reunião" por meeting e por aí vai).

E um argumento que sempre pinta nessas discussões é o fato da "dominação cultural" que o uso excessivo de estrangeirismos causa. "Desse jeito o português vai acabar!", diz um; "dominar a língua é apenas o primeiro passo para que eles nos dominem por completo!", adiciona outro. (Confesso que já estive também desse lado.)

Curioso é ver que a trajetória do mundo tem nos mostrado exatamente o oposto. Ao invés da "língua de país rico" se impor sobre a "língua de país pobre", o que se vê é o efeito contrário.

Os EUA são o principal campo dessa nova batalha. Estive em Nova York em 2009 e reparei uma semelhança entre as propagandas no metrô de lá e as daqui: em ambos os lugares, um dos tipos de anúncio que mais se vê é o de... escolas de inglês! Lá, tal qual aqui, o apelo da publicidade é falar que estudar inglês "abre portas no mercado de trabalho". Isso em um país majoritariamente falante da língua inglesa, que fez com que este idioma percorresse todo o globo e se tornasse praticamente uma língua universal.

Claro que a situação se deve à imensa quantidade de imigrantes que os EUA recebem há décadas. Ou melhor: os EUA atraem imigrantes desde sua fundação, mas de uns anos para cá o número mais expressivo que chega ao país é o composto por latinos. Esta camada acaba não aprendendo o inglês como fizeram os estrangeiros de antes (não sei o motivo disso, não perguntem), e com isso cresce de maneira impressionante o número de cidadãos norte-americanos (sim, não estamos falando de imigrantes ilegais, e sim de gente que tem o passaporte do país) que não falam o inglês, ou o têm apenas como seu segundo idioma.

As campanhas eleitorais nos EUA, já há alguns anos, trazem peças em espanhol, e a publicidade de tantos outros segmentos também adere ao idioma latino. Há redes de TV e rádio com programação unicamente em espanhol, enfim: é possível ser americano sem falar inglês.

E ontem, ouvindo o ótimo podcast The World In Words, tomei conhecimento da reação que muitos americanos têm empreendido contra esta situação. Os EUA não têm o inglês como sua língua oficial - e estes grupos têm lutado para que isso passe a ser realidade. Emendas individuais nos estados que compõem a federação têm sido aprovadas, e a tendência é que a coisa avance.

O momento atual da política dos EUA, com o avanço do Tea Party e de outros movimentos conservadores, acaba sendo perfeito para que este debate se fortaleça.

O podcast foi finalizado ao som de "Press One For English", canção do grupo country Rivoli Revue que se tornou uma espécie de hino do movimento. O título da música é uma referência a algo que tem causado irritação máxima nos puritanos - o fato de que, ao ligar para algum serviço com atendimento automático de chamadas, a primeira mensagem que se ouve é um pedido para a escolha de qual língua se dará a conversação. "Como assim eu tenho que apertar algo para falar em inglês?!", questionam.

Vejam a letra, com uma tradução por minha conta, e abaixo confiram o vídeo. Façam seus julgamentos.

Press 1 for English

Hey, I can't read that sign out there
Please tell me what's it say
We have to have subtitles
In five languages these days

Now we don't ask too much
To share this land of liberties
But if it's not too much to ask
Could you please speak English

(Chorus)

English is my language
It's the language of this land
And every sign that's posted here
I should understand

I do not live in China, Mexico
No foreign place
And English is the language
Of the United States

Now I'll speak very clear for you
So there'll be no mistake
My family fought and died
Protecting freedoms in these states

Now we all welcome those who come
But when you reach our shores
Folks you should speak our language
Not the one you spoke before

(Repeat chorus)

Now I'm proud of this country
And this great Democracy
And I believe an open door
Should be our policy

But for these opportunities
We'd simply ask you this
Hey you're the one who chose to come
Now choose to speak English

Now here's one thing I question
And try to understand
Hey why must I press one for English
When it's the language of this land

Aperte 1 para inglês

Ei, eu não consigo ler aquele aviso
Me explique o que ele diz
Nós temos que ter legendas
Em cinco idiomas hoje em dia

Nós não exigimos muito
Para dividir esta terra de liberdades
Mas por favor, se não for pedir demais
Você poderia falar inglês?

Refrão

Inglês é minha língua
É a língua deste país
E cada aviso que é colocado aqui
Eu deveria entender

Eu não moro na China, nem no México
Nem nenhum outro país
E inglês é a língua
Dos Estados Unidos

Agora vou te falar bem claramente
Para não haver confusão
Minha família lutou e morreu
Protegendo a liberdade nestes estados

Agora nós recebemos bem todos que chegam
Mas quando vocês alcançarem nossas entradas
Caras, vocês deveriam falar a nossa língua
E não a que vocês falavam antes

(Repete refrão)

Eu tenho orgulho deste país
E sua grande democracia
E acredito que portas abertas
Devem ser nossa política

Mas para essas oportunidades
Apenas pedimos isso
Ei, você que escolheu vir
Agora escolha falar inglês

E agora uma pergunta que eu faço
E tento entender
Porque tenho que apertar 1 para inglês
Se inglês é a língua deste país?

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Há uma revolução pouco notada em curso

Tem passado meio batida uma questão que, se levada à frente, mudará toda a cara do cenário eleitoral brasileiro: a aprovação das candidaturas avulsas.

Resumidamente, as candidaturas avulsas são aquelas que não têm vínculo com partido algum. Nos dias atuais, para que um brasileiro se lance candidato, é preciso que pertença a alguns dos nossos 27 partidos. Caso este sistema avance, no Brasil poderão aparecer candidaturas como as "independentes", muito populares nos EUA.

A ideia foi aprovada pela Comissão da Reforma Política do Senado e ainda terá que ser apreciada pelo plenário do próprio Senado e também pela Câmara dos Deputados. Ou seja: deve demorar muito para que seja posta em prática, e muito provavelmente não vigorará nas eleições do ano que vem.

Seja como for, cabe discutirmos o que acontecerá caso se torne uma realidade.

As principais vítimas das candidaturas avulsas serão, sem dúvida, os partidos pequenos. Daria até para dizer que muitos entrariam em vias de extinção caso o novo sistema vingue. Pelo seguinte: a necessidade do vínculo entre candidato e legenda faz com que a imensa maioria dos partidos nacionais sejam simplesmente balcões de registros de candidatos. Ou alguém acredita que a maioria dos partidos nacionais represente mesmo as correntes ideológicas da sociedade brasileira?

Sem seu poder "carimbador", os partidos menores não iriam muito adiante. E talvez a democracia ganhe, já que os partidos que sobreviveriam teriam que se destacar, que efetivamente representar algo mais do que um simples fornecedor de números.

Há que se pensar também como ficariam as eleições propriamente ditas, em termos mais práticos: qual será o critério para a atribuição de números a estes candidatos? Como será a sua aparição no horário eleitoral? Para as eleições proporcionais, como ficaria a questão do coeficiente? Cada candidato teria que atingi-lo por conta própria?

É difícil também entender como a novidade se dará em termos de marketing eleitoral. Ao estarem desvinculados a partidos, os candidatos terão mais "legitimidade" para se proclamarem uma novidade, surfando assim no consenso de que "político é tudo igual". Já os partidos atuais poderão aproveitar o fato para fortalecer a campanha pelo voto de legenda, apostando na unidade e na legislação da fidelidade partidária - que, embora ainda entre alguns tropeços, ganhou a aprovação da população.

Ainda há muito o que se discutir - e, como dito no início do texto, tenho verificado que a importantíssima questão não tem recebido a atenção que deveria. Tomara que isso se modifique.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Falando em novo partido...

Ontem, ouvindo rádio, levei um susto quando uma propaganda partidária entrou no ar. A propaganda começava com um narrador que questionava: "o que você espera de um novo partido?" Na sequência, pessoas respondiam dizendo que gostariam que este novo partido lutasse por mais emprego, promovesse a sustentabilidade, fosse composto por pessoas honestas, e assim por diante.

Ao ouvir sobre o "novo partido", me surpreendi com o fato do PSD já estar com uma campanha em cadeia nacional. "Caramba, o partido foi fundado esses dias e já está sendo divulgado na rádio, que rapidez, eu achava que ainda faltava o registro no TSE e....". Até que, na conclusão da peça, anuncia-se que a propaganda é do PMDB. O "novo partido", então, é o tradicionalíssimo do número 15, do vice-presidente Michel Temer.

Não sei se a peça do PMDB - direcionada ao público de São Paulo - foi planejada antes da confirmação da criação do PSD. Bem possível, já que o calendário das inserções é definido com bastante antecedência e, em anos não-eleitorais, é costumeiro que o teor das inserções seja mais "frio" e menos relacionado a eventos momentâneos. Caso esta hipótese seja a verdadeira, é nítido que o PMDB adotou a marca de "novo partido" para se desvincular da figura de Orestes Quércia, que presidiu a sigla por décadas até a sua morte, no ano passado.

Apesar de ter sido governador e de deter imensa influência no jogo político estadual, Quércia era uma figura com muita rejeição em São Paulo. A propaganda sugeriria, com base nisso, que o partido está deixando para trás a figura do ex-governador - algo como "pode vir, o Quércia não está mais aqui, agora estamos traçando novos rumos". Curioso.

E, caso a ideia do "novo partido" tenha sido cunhada após a criação do PSD, das duas uma: ou houve muita inocência por parte dos seus criadores, que não pensaram na possibilidade de associação com o partido de Kassab, ou desenvolve-se uma tentativa de marcar o nome do PMDB no embalo da agitação causada pelo PSD. Aguardemos uma explicação oficial.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Novo partido é um problema?

Nestes últimos dias foi formalizada a criação do Partido Social Democrata (PSD), o mais novo partido brasileiro. A sigla, como já é sabida, nasceu da insatisfação do prefeito paulistano Gilberto Kassab com o DEM, partido ao qual era filiado há anos. Kassab queria ter mais autonomia dentro de um partido - e também se aproximar do governo federal -, viu que não poderia consegui-lo no DEM, temeu mudar de partido e ser acuado pela lei da fidelidade partidária, e então constatou que a criação de uma nova sigla seria o caminho mais adequado.

Um dos principais aliados de Kassab na nova sigla será o vice-governador de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, também ex-DEM.

Ao contrário do que se previa inicialmente, o PSD disputará eleições em 2012 (as primeiras conversas sugeriam que o partido se fundiria imediatamente com o PSB). Ou seja, teremos um partido novo na próxima disputa, que elegerá prefeitos e vereadores.

Cabe então discutir como se dará o trabalho de marketing de um partido que enfrentará sua primeira eleição.

Poderíamos dizer que o PSD passará apertos, já que, justamente por ser novato, não é conhecido do eleitorado e não tem um recall de eleições anteriores. Mas acredito que o que tende a ocorrer é justamente o oposto. Com exceção de PT e PSDB (e também o PMDB, mas em menor grau), há algum grande partido, em termos de conhecimento do eleitorado? Percebam que não estou falando em número de filiados, muito menos fazendo um juízo de valor sobre as siglas. Me refiro ao peso de suas marcas.

Questiono: haverá muita diferença, para o eleitor comum, entre PSD e PSB, PTB, PDT, DEM, PR e as outras siglas que compõem o espectro político nacional?

O eleitor brasileiro não vota em propostas e nem em partidos, e sim em pessoas - e aí não estou fazendo nenhum raciocínio genial, mas apenas inferindo sobre o que a história das eleições nos mostram. E pessoas o PSD tem - o prefeito da maior cidade e o vice-governador do maior estado do Brasil não são pouca coisa.

Durante as eleições de 2008, Kassab venceu em uma São Paulo recebendo votos de eleitores que não estavam interessados em votar em ninguém do PT nem do PSDB, e sim em alguém cujo estilo administrativo os agradava. A formalização do novo partido faz de Kassab candidatíssimo ao governo de São Paulo em 2014 (ainda que pesquisas recentes apontem que sua popularidade na capital paulista vai de mal a pior).

De todos os problemas que Kassab enfrentará nas suas próximas empreitadas, o fato de ser de um partido novo tende a ser o menor deles.

E cobrem-me, leitores: assim que o PSD divulgar sua logomarca e seu site, farei uma análise aqui.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

A primeira marca do governo Dilma

Foram anunciados na semana passada os novos logomarca e slogan do governo federal. Eles substituem o "Brasil - Um país de todos" que, intocado durante os oito anos da gestão Lula, às vezes parecia mesmo uma marca de Estado, e não de governo. Oito anos não é pouca coisa. Confira:

Agora vamos às opiniões. Aliás, antes delas, uma contextualização. Como disse o amigo Alan Kardec Borges no Voto é Marketing, em post de 2009, logomarca e slogan costumam figurar entre as prioridades dos políticos que assumem seus mandatos. As peças estabelecem um dos primeiros sinais de uma mudança real, tangível; o cidadão que se depara com uma obra (ou propaganda na TV, ou qualquer outra coisa relacionada) que traz a nova identidade visual percebe que a administração se modificou, que há um novo governo em curso. É, por isso, vital.

(Pequeno parêntese: não sei como funciona em outros países, mas aqui no Brasil acredito que haja um pequeno abuso na utilização das logomarcas. A cada quatro anos, uma cidade/estado/país está sujeita a ter sua identidade visual por completo, e aí lá se vão consideráveis somas de dinheiro para adaptação aos novos padrões. Sem contar os logotipos que se utilizam, sem muito disfarce, das marcas dos partidos do governante da ocasião. Mas isso é uma opinião pessoal, que não serve para mudar o quadro atual. Prossigamos.)

A nova logomarca do governo federal, intencionalmente, traduz o que Dilma Rousseff propôs o tempo todo em sua campanha - continuidade, mas com um toque pessoal e de evolução. É o que se observa. A peça é, de certo modo, parecida com a do governo Lula (ao lado). Prosseguem as letras grandes, o "BRASIL" em caixa alta, exposto de maneira horizontal.

Onde se vê a diferença - e gritante - é no uso das cores. A logomarca de Dilma é mais sóbria do que a de Lula, e bem menos ousada. Enquanto a do governo anterior abusava de cores distintas, para reforçar mesmo a ideia da pluralidade, a atual fica no verde-amarelo, com o losango da bandeira nacional exposto sobre o A de Brasil. Fica a impressão que a nova marca quer ser vista como mais séria, mais "disciplinada" que sua antecessora. Comparação pura e simples? A de Lula ganha. Em duas palavras (ou é uma só por conta do hífen?), é possível definir a marca atual como sem-graça.

Quanto ao slogan... bem, aí arrisco dizer que a gestão anterior ganha, e de goleada. "Um país de todos" é uma frase simples, direta, precisa e de muito conteúdo. Lula assumiu o poder pregando a inclusão, e fez disso a marca de seu governo. "Um país de todos" traduz essa filosofia como talvez nenhuma outra marca conseguiria.

"País rico é país sem pobreza" é, também, outra tradução de uma meta de governo - já que o Brasil se tornou mais "rico" e "desenvolvido" nos últimos anos, é hora de transformar essa condição em uma melhoria efetiva na qualidade de vida dos brasileiros, acabando com a pobreza. Até aí tudo bem. O principal problema está no fato da frase ter, digamos, pouco apelo publicitário. "País rico é país sem pobreza" é uma frase mais longa, mais rebuscada, que não soa tão imediata quanto "Um país de todos". Além de ter um caráter meio até de certo modo marcial - parece um lema de exército, uma declaração de fé, um trecho de hino. Quebrou a "simpatia inclusiva" da marca anterior para uma pegada mais agressiva, mais forte.

As intenções da marca são boas - como já dito, frase e logotipo reforçam bem a ideia da continuidade com progressão. Mas talvez a escolha das peças pudesse ser feita com mais capricho. É claro que não é isso que determinará (e nem de longe!) o sucesso ou fracasso do governo Dilma, mas um pouquinho mais de qualidade viria bem.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Já conhece o Partido Militar Brasileiro?

Em novembro, joguei aqui uma dúvida no ar sobre como seria um "Tea Party brasileiro". O post da ocasião foi inspirado pelo sucesso que o movimento ultraconservador Tea Party, liderado por Sarah Palin, estava (e ainda está) fazendo nos EUA. Questionei o fato do Brasil não ter um partido político assumidamente de direita.

E parece que a resposta foi encontrada: no final de janeiro, uma convenção nacional foi o impulso que faltava para a consolidação da ideia do Partido Militar Brasileiro (PMB). Agora, o PMB aguarda os trâmites burocráticos para ser juridicamente um partido político e já disputar as eleições de 2012.

(Curiosidade: se realmente utilizar a sigla PMB, o Partido Militar Brasileiro trará de volta ao cenário político o acrônimo do Partido Municipalista Brasileiro, que existiu durante a década de 1980 e cujo feito de maior notoriedade foi ter atraído Silvio Santos para a campanha presidencial de 1989, em candidatura que viria a ser cassada.)

Como já falei naquele post sobre o Tea Party e em outras ocasiões, acho, sinceramente, que faz falta ao Brasil um partido que se assuma de direita, que não tenha medo de encampar a bandeira do conservadorismo. Não são as minhas ideologias, mas acredito que faz bem ao Brasil saber quem defenda essas posturas.

O que há, hoje, são pessoas de direita pulverizadas entre as inúmeras siglas, que defendem uma ou outra causa direitista durante as campanhas eleitorais, de maneira difusa.

E há muitos partidos no Brasil? Sem dúvida! Mas o PMB - se cumprir o que está prometendo - será um partido que "valerá", que terá uma razão de existir. Tal qual PCO e PSTU, seus inversos ideológicos, defenderá uma causa que não é contemplada por outras siglas. O problema do excesso de partidos no país não tem a ver com as siglas do tipo do PMB e das pequenas de esquerda, e sim das dezenas de partidos fisiológicos com base programática nenhuma e que só servem como balcões de candidatura.

Um aspecto interessante sobre o PMB é que ele tende a ser o partido brasileiro com a maior proporção de mulheres entre seus filiados - como, pela lei atual, os militares não podem participar de partidos políticos, é possível que suas esposas entrem na sigla e a administrem, como ocorre com os sindicatos da categoria.

Veja mais a respeito no site do Partido Militar Brasileiro, e vá formulando sua opinião.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Freakonomics e o tostines eleitoral

Estou lendo Freakonomics, livro de 2005 escrito por Steven Levitt e Stephen Dubner que já tem um quê de clássico. Virou sucesso instantâneo, gerou sequências (e obras nele inspiradas) e deve estar garantindo um bom rendimento aos seus autores.

Em síntese, o que o livro traz é uma série de pesquisas produzidas por Levitt que buscam contestar algumas verdades absolutas e apresentar relações entre fatos aparentmente distantes entre si. Por exemplo: lá se diz que a probabilidade de uma criança morrer em uma casa com piscina é muito maior do que a que há em uma casa com uma arma de fogo; que professores mentem para que seus alunos tenham melhores resultados em exames que avaliam o desempenho das escolas (e que tal fraude pode ser descoberta com apenas um pouquinho de esforço); e que a redução da criminalidade nos EUA é fruto da liberação do aborto décadas atrás, e não de políticas de combate ao crime, e por aí vai.

Como disse Ubiratan Leal em texto em que analisou Soccernomics (uma obra inspirada em Freakonomics), "números não são subjetivos, mas a escolha deles e o modo de usá-los são". É por isso que se deve ter uma bela dose de cautela ao analisar conclusões que Freakonomics trata como verdades absolutas. Números são inquestionáveis e revelam muita coisa, mas colocar um pé atrás sobre o que se vê nunca é mau negócio.

E é sobre um dos dados também apresentados em Freakonomics que eu queria debater. O livro cita uma pesquisa de Levitt que analisou a relação entre o dinheiro das campanhas eleitorais e o sucesso dos candidatos. Há o consenso geral de que quanto mais dinheiro tem uma campanha, mais provável que ela seja bem sucedida; Levitt contesta isso, dizendo que, de fato, as campanhas com mais dinheiro são as que se dão bem - mas isso se deve ao fato de que os doadores já sabem que as campanhas tendem a ser vitoriosas, e utilizam isso como critério para investir suas quantias. Ou seja, a campanha tem dinheiro porque deverá dar certo, e não o oposto.

É mais uma representação clássica do "dilema de Tostines". Levitt crava que "são fresquinhas porque vendem mais", ou seja, têm dinheiro porque vencerão a disputa. E aí?

Admito que, tentando transpor o caso à realidade brasileira, ainda não formulei uma opinião derradeira a respeito. É fato que o comportamento eleitoral aqui, para as campanhas majoritárias (presidente, governadores, prefeitos) é mais previsível do que parece. Era óbvio que PT e PSDB polarizariam a disputa nacional em 2010, como vêm fazendo desde 1994; nos planos estaduais e municipais, há situações que são também bem previsíveis, de modo que um doador já pode saber para que lado a disputa tende a pender.


Por outro lado, nós não convivemos aqui com a figura das doações individuais (a menos não em caráter expressivo). Ou seja, a tal "motivação" para doar em uma campanha não é uma questão decisiva.

Tendo a acreditar que a opinião de Levitt valha para as eleições majoritárias brasileiras, mas não para as proporcionais (deputados e vereadores), porque neste universo específico o desconhecimento dos candidatos por parte da população e o excesso deles faz com que ter dinheiro seja um fator essencial para o triunfo.

Algum outro palpite?

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

"Pensar global e agir local" - mesmo!

O ocorrido é antigo, mas recente texto publicado no Congresso em Foco me fez lembrar do caso e deu a ideia de discutir o tema aqui. Apesar de ser algo das eleições do ano passado, trata-se de uma questão que permanece ativa e, mais que isso, tende a se aprofundar no próximo ano.

Em 2010, como todos sabem, o fenômeno das eleições foi o Tiririca, deputado mais votado em São Paulo e que fez uma campanha baseada na brincadeira, na tiração de sarro, e que se beneficiou do descrédito do brasileiro em relação à política.

A qualidade das peças (e não estou sendo irônico: a campanha queria fazer rir e estimular o "voto de protesto", e nisso foi muito eficiente) fez com que as propagandas de Tiririca corressem o Brasil e se tornassem exemplos concretos do que se convencionou chamar de marketing viral.

Talvez durante as eleições vocês tenham visto o vídeo abaixo, do candidato Henrique Oliveira, do PR do Amazonas:



Do mesmo partido e tendo o mesmo número de Tiririca, Henrique convocou o humorista para dar uma força na sua campanha. Utilizar "famosos" como cabos eleitorais na campanha televisiva não chega a ser nenhuma novidade, mas... será que Henrique Oliveira traria Tiririca para sua campanha se o fenômeno já não estivesse em curso?

Evidente que não! Henrique Oliveira se aproveitou de algo que ocorria - a fama da inusitada campanha de Tiririca que, por meio da internet, repercutiu muito, mas muito além do seu público inicial, os eleitores paulistas.

O caso nos mostra que nas campanhas atuais, na tal da "era do Youtube", as referências geográficas em uma campanha eleitoral podem ser minimizadas. Candidatos de diferentes regiões podem se aliar em prol de uma plataforma comum, e ocorrências nacionais podem ser repercutidas com mais facilidade.

Em 2010, a indignação nacional contra José Sarney foi muito, mas muito menos explorada do que poderia pelos candidatos ao Congresso. Ele é um senador do Amapá, mas sua conduta vem sendo reprovada por brasileiros de todos os cantos; uma campanha bem estruturada pode utilizar o fato inclusive na disputa em um cargo de Câmara Municipal. Além de soluções práticas (asfaltamento de ruas, mais postos de saúde, melhorias na educação, etc), os eleitores querem um político com o qual se identifiquem, nutram afinidade. E a internet está aí pra isso.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Os famosos foram empossados. E aí?

Ontem, como todos sabem, ocorreu a posse dos deputados e senadores eleitos (ou reeleitos, ou que nem chegaram a ser eleitos mas se beneficiaram com a licença dos que preferiram outros cargos, mas enfim). Na ocasião também foram eleitos - ou melhor, e aí com mais precisão, reeleitos - os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, respectivamente José Sarney (PMDB-AP) e Marco Maia (PT-RS).

Naturalmente, a posse dos novos parlamentares ganhou destaque nos veículos de comunicação. Mas, à parte das eleições de Maia e Sarney, o que recebeu mais enfoque da imprensa foi a chegada dos parlamentares-celebridades: Tiririca (PR-SP), Romário (PSB-RJ), Popó (PRB-BA), Jean Wyllys (PSol-RJ) e outros.

Quase sempre, a citação a esse tipo de parlamentar é em tom de crítica: o triunfo deles escancara a fragilidade do sistema nacional, só ganharam porque são famosos, não acrescentarão nada à política e assim por diante.

Aí é hora de reiterar o que já disse aqui outras vezes. Não acredito - mesmo! - que o fato de uma pessoa ser "famosa" a faz menos (nem mais, evidentemente) preparada para a vida pública. Com exceção de Tiririca, que durante a campanha fez escárnio da função de deputado, os outros ganharam as eleições falando sério, apresentando propostas e tudo o mais - exatamente da mesma forma como fizeram os outros candidatos. Se beneficiaram de sua fama prévia? Evidentemente. Em eleições proporcionais, com uma overdose de candidatos e pouquíssimo espaço no horário eleitoral gratuito, já ser conhecido da população ajuda bastante. Mas é incorreto (e perigoso!) afirmar que essas pessoas só foram eleitas por conta de sua fama. Não fosse por isso, nomes como Agnaldo Timóteo, Maguila, Vampeta e Dinei (todos concorreram por São Paulo em 2010) não teriam ficado a ver navios.

É cômodo colocar a culpa no "povo" - assim, de forma abstrata - e amaldiçoar o trabalho das celebridades na vida pública desde seu início. Mas, infelizmente, a qualidade dos legisladores brasileiros anda tão baixa que não temos nenhuma garantia que políticos "convencionais" fariam melhor trabalho. Boa sorte a Jean Wyllys, Popó, Romário e companhia. O Brasil precisa deles, quer queiram os críticos, quer não.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Palin, um paradoxo político

Sarah Palin não é assunto inédito neste blog. Já falei sobre ela outras vezes, diretamente e também numa referência ao fato dela ser a principal liderança de um movimento político que cresce nos EUA.
sskennel/flickr
Agora, neste presente momento, não há um motivo específico para falar sobre ela - acredito que não seja justo relacioná-la ao ataque do Arizona, que vitimou a congressista democrata Gabrielle Giffords.

É só uma divagação a qual cheguei a pensar um pouco sobre a figura de Palin e seu posicionamento político.

Como dito no post de julho do ano passado, Sarah Palin é, de longe, a mais forte candidata a ser "a primeira mulher presidente dos EUA", ao menos no tempo corrente. A matemática é simples: os EUA têm dois partidos fortes, o Democrata e o Republicano; se Barack Obama fizer um bom governo, será candidato natural à reeleição, e então Hillary Clinton (ou outra liderança do partido) terá que esperar; se fizer um mau governo, é pouco provável que seja sucedido por um republicano; e entre os republicanos, que podem chegar à Casa Branca já em 2012 ou na eleição seguinte, não há mulher mais forte do que Palin.

Prossigamos.

Quando minorias conquistam posições importantes, é natural tratar o acontecimento como "histórico", "emblemático", "fruto de uma nova época" e assim por diante. As barreiras vêm caindo, chegará um dia em que estes acontecimento serão (felizmente) vistos como "normais", mas ainda não o são.

Então o mundo ainda se exalta quando os EUA têm seu primeiro presidente negro; o Brasil, sua primeira chefe de estado mulher; e não tardará muito para vermos presidentes/governadores/lideranças em geral abertamente homossexuais, ou com deficiência física, seguidores de religiões menos populares, entre outras.

Mas voltamos às barreiras. A da Presidência dos EUA - o cargo político mais importante do mundo - foi quebrada para os negros com a vitória de Barack Obama. Falta ainda a das mulheres.

E é aí que chego ao ponto curioso. Não será interessante ver tal barreira histórica ser rompida por uma candidatura... de direita?

Nos habituamos a ver as transformações sociais sendo conduzidas pelas lideranças de esquerda. E aí se encaixam desde as revoluções, como as de Cuba e da URSS, até as lutas cotidianas empreendidas pelos militantes das minorias - feminismo, luta LGBT, campanhas pela igualdade religiosa são causas que, embora em sua essência não atendam às diretrizes direita/esquerda, costumam ser tocadas por gente que é mais simpática a Karl Marx do que a Adam Smith.

Por tudo isso será um tanto quanto estranho caso Palin se torne presidente do EUA considerar que "um tabu está quebrado". O tabu das mulheres estará; mas da política empreendida, não. Será difícil cravar o possível acontecimento como uma vitória das "minorias" - ou, como a própria ex-governadora republicana se define, do "conservadorismo".